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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Com certeza, é melhor mudar pra cidade!

Carta do Zé, agricultor, para Luiz, da cidade - Luciano Pizzato (*)
Luiz, quanto tempo. Sou o Zé, seu colega do ginásio, que chegava sempre atrasado, pois a Kombi que pegava no ponto perto do sítio atrasava um pouco. Lembra, né, o do sapato sujo. A professora nunca entendeu que eu tinha que caminhar 4 km até o ponto da Kombi na ida e volta e o sapato sujava.
Lembra? Se não, sou o Zé com sono... hehe. A Kombi parava às onze horas da noite no ponto de volta, e com a caminhada ia dormir lá pela uma, e o pai precisava de ajuda para ordenhá as vaca às 5h30 toda manhã. Dava um sono. Agora lembra, né Luiz?

Pois é. Tô pensando em mudá aí com você. Não que seja ruim o sítio, aqui é uma maravilha. Mato, passarinho, ar bom. Só que acho que tô estragando a vida de você Luiz, e teus amigo aí na cidade. Tô vendo todo mundo fala que nóis da agricultura estamo destruindo o meio ambiente.

Veja só. O sítio do pari, que agora é meu (não te contei, ele morreu e tive que pará de estudá) fica só a meia hora aí da Capital, e depois 4 km a pé, só 10 minuto da sede do município. Mas continuo sem luz porque os poste não podem passar por uma tal de APPA que criaram aqui. A água vem do poço, uma maravilha, mas um homem veio aqui e falô que tenho que fazê uma outorga e pagá uma taxa de uso, porque a água vai acabá. Se falô deve ser verdade.
Pra ajudá com as 12 vaca de leite (o pai foi , né...) contratei o Juca, filho do vizinho, carteira assinada, salário mínimo, morava no fundo de casa, comia com a gente, tudo de bão. Mas também veio outro homem aqui, e falô que se o Juca fosse ordenhá às 5:30 h tinha que recebê mais, e não podia trabalhá sábado e domingo (mas as vaca não param de fazê leite no fim de semana). Também visitô a casinha dele, e disse que o beliche tava 2 cm menor de que devia, e a lâmpada (tenho gerador, não te contei!) estava em cima do fogão era do tipo que se esquentasse podia explodi (não entendi!). A comida que nóis fazia junto tinha que fazê parte do salário dele. Bom, Luiz tive que pedi pro Juca voltá pra casa, desempregado, mas protegido agora pelo tal homem. Só que acho que não deu certo, soube que foi preso na cidade roubando comida. Do tal homem que veio protegê ele, não sei se tava junto.

Na Capital também é assim né, Luiz? Tua empregada vai pra uma casa boa toda noite, de carro, tranquila. Você não deixa ela morá nas tal de favela, ou beira de rio, porque senão te multam ou o homem vai aí mandar você dar casa boa, e um montão de outras coisas. É tudo igual aí né?
Mas agora eu e a Maria (lembra dela, casei) fazemo a ordenha às 5:30, levamo o leite de carroça até onde era o ponto da Kombi, e a cooperativa pega todo dia, se não chove. Se chove, perco o leite e dô pros porco.
Té que o Juca fez economia pra nóis, pois antes me sobrava só um salário por mês, e agora eu e Maria temos sobrado dois dalário por mês. Melhorô. Os porco não, pois também veio outro homem e disse que a distância do rio nõ pode ser 20 metro e tinha que derrubá tudo e fazê a 30 metro. Também colocá umas coisas pra proteger o rio. chei que ele tava certo e disse que ia fazê, e sozinho ia demorá uns trinta dias, só que mesmo assim ele me multô, e pra pagá vendí os porco e a pocilga, e fiquei só com as vaca. O promotor disse que desta vez por este crime não vai me prendê, e fez eu dá cesta básica pro orfanato. Ô Luiz, aí quando vocês sujam o rio também paga multa né?

Agora a água do poço posso pagá, mas tô preocupado com a água do rio. Todo ele deve ser como na sua cidade Luiz, protegido, tem mato dos dois lado, as vaca não chegam nele, não tem erosão, a pocilga acabô... Só que algo tá errado. pois ele fede e a água é preta e já subi o rio até a divisa da Capital, e ele vem todo sujo e fedendo aí da sua terra.

Mas vocês não fazem isso né Luiz? Pois aqui a multa é grande, e dá prisão. Cortá árvores então, vige. TInha uma árvore grande que murchô e ia morrê, então pedi pra eu tirá, aproveitá a madeira pois até podia cair em cima da casa. Como ninguém respondeu aí do escritório que fui, pedi na Capital (não tem aqui não), depois de uns 8 mês, quando a árvore morreu e tava apodrecendo, resolvi tirar, e veja Luiz, no outro dia já tinha um fiscal aqui e levei uma multa. Acho que desta vez me prende.

Tô preocupado Luiz, pois no rádio deu uma nova lei vai dá multa de 500,00 a 20.000,00 por hectare e por dia da propriedade que tenha algo errado por aqui. Calculei por 500,00 e vi que perco o sítio em uma semana. Então é melhor vendê e ir morá onde todo mundo cuida da ecologia, pois não tem multa aí. Tem luz, carro, comida, rio limpo. Olha, não quero fazê nada errado, só falei das coisa por ter certeza que a lei é pra todos nóis.

E vou morar com você, Luiz. Mais fique tranquilo, vou usá o dinheiro primeiro pra comprá aquela coisa branca, a geladeira, queaqui no sítio eu encho com tudo que produzo na roça, no pomar, com as vaquinha, e aí na cidade, diz que é fácil, é só abri e a comida tá lá, prontinha, fresquinha, sem precisá de nóis, os criminosos aqui da roça. Até Luiz.

Ah, desculpe Luiz, não pude mandar a carta com papel reciclado pois não existe por aqui, mas não conte até eu vendê o sítio.

(Todos os fatos e situações de multas e exigências são baseados em dados verdadeiros. A sátira nõ visa atenuar as responsabilidades, mas alertar o quanto o tratamento ambiental é desigual e discricionário entre o meio rural e o meio urbano.)

(*)É engenheiro florestal, especialista em direito sócioambiental e empresário, diretor de Parques Nacionais e Reservas do IBDF/IBAMA 88/89, deputado desde 1989, detentor do 1º Prêmio Nacional de Ecologia. Copiado de: http://noticias.ambientebrasil.com.br/noticia/?id=41996

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