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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Carta do Zé agricultor para o Luís da cidade


Luis, quanto tempo. Sou o Zé, seu colega de ginásio, que chegava sempre atrasado, pois a Kombi que pegava no ponto perto do sítio atrasava um pouco. Lembra, né, o do sapato sujo? A professora nunca entendeu que tinha de caminhar 4 km até o ponto da Kombi na ida e volta e o sapato sujava.
Lembra? Se não, sou o Zé com sono... hehe. A Kombi parava as onze da noite no ponto de volta, e com a caminhada ia dormi lá pela uma, e o pai precisava de ajuda para ordenhá as vaca às 5h30 toda manhã. Dava um sono. Agora lembra, né Luis?!

Pois é. Tô pensando em mudá ai com você. 

Não que seja ruim o sítio, aqui é uma maravilha. Mato, passarinho, ar bom. Só que acho que tô estragando a vida de você Luis, e teus amigo ai na cidade. To vendo todo mundo fala que nóis da agricultura estamo destruindo o meio ambiente.

Veja só. O sitio do pai, que agora é meu (não te contei, ele morreu e tive que pará de estuda) fica só a meia hora ai da Capital, e depois dos 4 km a pé, só 10 minuto da sede do município. Mas continuo sem Luz porque os Poste não podem passar por uma tal de APPA que criaram aqui. A água vem do poço, uma maravilha, mas um homem veio e falô que tenho que faze uma outorga e paga uma taxa de uso, porque a água vai acabá. Se falô deve ser verdade.
Pra ajudá com as 12 vaca de leite (o pai foi, né ...) contratei o Juca, filho do vizinho, carteira assinada, salário mínimo, morava no fundo de casa, comia com a gente, tudo de bão. Mas também veio outro homem aqui, e falo que se o Juca fosse ordenha as 5:30 tinha que recebe mais, e não podia trabalha sábado e domingo (mas as vaca não param de faze leite no fim de semana).
Também visitô a casinha dele, e disse que o beliche tava 2 cm menor do que devia, e a lâmpada (tenho gerador, não te contei !) estava em cima do fogão era do tipo que se esquentasse podia explodi (não entendi ?). A comida que nóis fazia junto tinha que faze parte do salário dele. Bom, Luis tive que pedi pro Juca voltá pra casa, desempregado, mas protegido agora pelo tal homem. Só que acho que não deu certo, soube que foi preso na cidade roubando comida. Do tal homem que veio protegê ele, não sei se tava junto.
Na Capital também é assim né, Luis? Tua empregada vai pra uma casa boa toda noite, de carro, tranquila. Você não deixa ela morá nas tal favela, ou beira de rio, porque senão te multam ou o homem vai aí mandar você dar casa boa, e um montão de outras coisa. É tudo igual aí né?
Mas agora, eu e a Maria (lembra dela, casei ) fazemo a ordenha as 5:30, levamo o leite de carroça até onde era o ponto da Kombi, e a cooperativa pega todo dia, se não chove. Se chove, perco o leite e dô pros porco.
Té que o Juca fez economia pra nóis, pois antes me sobrava só um salário por mês, e agora eu e Maria temos sobrado dois salário por mês. Melhorô. Os porco não, pois também veio outro homem e disse que a distancia do Rio não podia ser 20 metro e tinha que derrubá tudo e fazer a 30 metro. Também colocá umas coisa pra protege o Rio. Achei que ele tava certo e disse que ia fazê, e sozinho ia demorá uns trinta dia, só que mesmo assim ele me multo, e pra pagá vendi os porco e a pocilga, e fiquei só com as vaca. O promotor disse que desta vez por este crime não vai me prendê, e fez eu dá cesta básica pro orfanato. O Luis, ai quando vocês sujam o Rio também paga multa né?
Agora a água do poço posso pagá, mas to preocupado com a água do Rio. Todo ele aqui deve ser como na tua cidade Luis, protegido, tem mato dos dois lado, as vaca não chegam nele, não tem erosão, a pocilga acabo . Só que algo tá errado, pois ele fede e a água é preta e já subiu o Rio até a divisa da Capital, e ele vem todo sujo e fedendo ai da tua terra.

Mas vocês não fazem isto né Luis? Pois aqui a multa é grande, e dá prisão. 

Cortá árvore então, vige. Tinha uma árvore grande que murchô e ia morre, então pedi pra eu tirá, aproveitá a madeira pois até podia cair em cima da casa. Como ninguém respondeu ai do escritório que fui, pedi na Capital (não tem aqui não), depois de uns 8 mes, quando a árvore morreu e tava apodrecendo, resolvi tirar, e veja Luis, no outro dia já tinha um fiscal aqui e levei uma multa. Acho que desta vez o delegado me prende.

Tô preocupado Luis, pois no radio deu que a nova Lei vai dá multa de 500,00 a 20.000,00 por hectare  e por dia da propriedade que tenha algo errado por aqui. Calculei por 500,00 e vi que perco o sitio em uma semana. Então é melhor vende, e ir morá onde todo mundo cuida da ecologia, pois não tem multa ai. Tem luz, carro, comida, rio limpo. Olha, não quero fazê nada errado, só falei das coisa por ter certeza que a Lei é pra todos nois.
E vou morar cocê, Luis. Mais fique tranqüilo, vou usá o dinheiro primeiro pra comprá aquela coisa branca, a geladeira, que aqui no sitio eu encho com tudo que produzo na roça, no pomar, com as vaquinha, e ai na cidade, diz que é fácil, é só abri e a comida tá lá, prontinha, fresquinha, sem precisá de nóis, os criminoso aqui da roça.
Até Luis.
Ah, desculpe Luis, não pude mandar a carta com papel reciclado pois não existe por aqui, mas não conte até eu vendê o sitio.
(Todos os fatos e situações de multas e exigências são baseados em dados verdadeiros. A sátira não visa atenuar responsabilidades, mas alertar o quanto o tratamento ambiental é desiqual e discricionário entre o meio rural e o meio urbano.)
Por Ambiente Brasil - Luciano Pizzatto (*)
* É engenheiro florestal, especialista em direito socioambiental e empresário, diretor de Parques Nacionais e Reservas do IBDF/IBAMA 88/89, deputado desde 1989, detentor do 1º Prêmio Nacional de Ecologia.

Um comentário:

  1. Este texto serve para TODOS NÓS refletirmos muito, sobre a "questão ambiental" em nosso país! E serve para atentarmos para a grande disparidade com que são tratados os produtores rurais brasileiros, com relação ao meio ambiente.

    Nos idos dos anos 60 e 70, o governo incentivou muitos brasileiros, de várias regiões do país, a irem para a região Amazônica, para povoá-la e desbravá-la, ou seja, derrubar a floresta... e concedia muitos benefícios, àqueles que cumpriam com o seu papel de desbravador... (quanto mais desmatava, mais benefício conseguia). E com este pensamento, e muito trabalho, muitos desses desbravadores, construíram fortunas, ao longo dos anos. Alguns são hoje, grandes pecuaristas, grandes agricultores, grandes exportadores de grãos, etc, e movimentam o Agronegócio Brasileiro.

    No entanto, hoje as regras são outras. Os tempos mudaram, a idéia de desenvolvimento se transformou, e TODOS estes "ex-heróis" estão na ilegalidade, tendo em vista o nosso CÓDIGO FLORESTAL.

    Hoje, o que vemos, é que muitos destes produtores rurais, que se encontram com as suas propriedades à margem da lei, e que querem se adequar às novas regras ambientais, são discrimados e têm seus projetos travados pelo SISTEMA. Além de não receberem as orientações corretas por parte dos órgãos do governo, responsáveis pelo Meio Ambiente, são considerados os verdadeiros destruídores da natureza.

    Aqui no Sudeste do país, mais precisamente em Minas Gerias, a FAEMG, tem feito uma campanha de conscientização e informação, sobre as propriedades rurais e o meio ambiente. Eles querem deixar bem claro a TODOS, principalmente para o "pessoal da cidade", que é no meio rural, que geralmente, estão as nascentes d'água, e é lá que é produzida toda a água que chega às cidades, por pequenos córregos e riachos, que se encontram formando pequenos rios, que por sua vez se encontram, se transformando em rios maiores até serem captados nas cidades, pelas estações de tratametno de água. Os produtores rurais são também PRODUTORES DE ÁGUA, e protetores das nascentes, dos córregos, rios, matas, florestas, enfim, da NATUREZA! E por isso, e por várias outras coisas, merecem o respeito e o apoio de todos! Mas apesar disso, o que vemos muitas vezes é justamente o contrário. Pois durante muito tempo o próprio GOVERNO assimilou o produtor rural como destruidor da natureza, e essa visão, infelizmente, dura até hoje!

    O CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO data de 1965, e acredito eu, precisa de algumas mudanças. Neste momento, está tramitando no Congresso Nacional, um Projeto de Lei, que propõe mudanças no CÓDIGO FLORESTAL, que são de interesse dos produtores rurais, e que considera a realidade produtiva e ambiental de cada região do país. Vamos torcer para que a briga entre os Ministros Stephanes (Agricultura) e Carlos Minc (Meio Ambiente) não atrapalhe nesta conquista.

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